Escrever pode mudar tudo.


sexta-feira, 27 de julho de 2012

Arthur Rimbaud: Aurora

A prosa poética que segue foi (e ainda é) um texto impactante quando o li primeira vez, devia ter uns 16 anos. Nunca havia lido nada tão belo. Era uma aula de redação do professor Alvisto Skeff.  Decidi cursar Letras, o que nunca se concretizou. Perdi a tradução daquela primeira leitura, passei anos procurando o texto. Reencontrei-o em uma edição completa das obras de Rimbaud, da Topbooks, mas a tradução não tinha aquele sabor, o sabor da minha adolescência. Tentei recuperá-la retraduzindo o texto, mas aquela primeira vívida impressão ainda carrego comigo e só consigo encontrá-la dentro.



Aurora

Arthur Rimbaud

Abracei a aurora do verão.

Nada se mexia em frente aos palácios. A água estava morta. Os campos de sombra não deixavam as veredas do bosque. Eu caminhava, despertando hálitos vivos e mornos, e pedrarias me fitavam, e asas se erguiam sem barulho.

O primeiro acontecimento, na trilha já cheia de frescos e pálidos clarões, foi uma flor que me disse seu nome.

Sorri à loira wasserfall que se desgrenhava entre os pinheiros: no cume prateado reconheci a deusa.

Então levantei seus véus, um a um. Pela aleia, agitando os braços. Pela planície, onde a denunciei ao galo. Na cidade ela fugia por entre domos e campanários, e correndo como um mendigo sobre os cais de mármore, eu a caçava.

No alto da estrada, perto de um bosque de loureiros, capturei-a com seus véus amarfanhados, e senti um pouco seu imenso corpo. A aurora e o menino tombaram sob o bosque.

Ao acordar era meio-dia.